Divã do Borges 14

Estava em meu consultório, o relógio ia marcar umas duas da tarde, quando bateu na porta uma gatinha chamada Janis.

– Olá, dr. Borges.

– O-olá, Janes.

– O senhor esqueceu de mim, está lembrado? E esqueceu que venho de outro país só para me consultar?

Fiquei todo rosado de vergonha e só fiquei rosa porque não consigo ficar vermelho.

– É, perdão, tenho feito muitas consultas…

– Pois você sabem quem eu sou?

– Como assim se sei, claro que sei… Janes.

– Janes JOPLIN! Não sou uma qualquer.

– Perdão, vamos logo então, em que posso lhe ajudar?

O caso:

Sou uma gatinha que mora num país muuito distante daí! Vim aqui apesar de toda minha dificuldade com essa língua – o português. Eu sou uma felina muito especial: tenho um coração que teima em bater num compasso diferente dos outros, fazendo um barulhinho engraçado – acho que sempre gostei de música e nasci com meu ritmo único! E por causa disso, o doutor disse que eu devo ficar sempre bem magrinha, pois se eu ficar barriguda, meu coraçãozinho não vai aguentar. Mas, Borginho, pelo mais que eu tente, eu não me controlo!! Tudo que vejo pela frente, eu quero comer, pois esse regime me faz sofrer muito! Quando a mamãe tem um prato de comida, lá vou eu correndo tentar tirar uma lasca dele!! Não resisto! Já roubei pacote de macarrão do armário, já experimentei até aveia e sabonete, e outro dia a mamãe achou um dos seus elásticos de cabelo na minha caca… Ela tá desesperada pois eu não consigo perder peso, sou uma gatinha gulosa, e estou começando a atacar coisas que fazem o veterinário duvidar!! Só como ração light e o último sachê que comi foi um presente de Natal…

Borginho, ajuda minha mamãe e eu? Como fazer pra conter essa lombriga gigante dentro da minha barriga?

A análise:

1 – Janes é uma gatinha de outro país. Mas que país? Ela não relatou, mas descobri por sua ficha cadastral em meu consultório que é França. França, alta gastronomia, doces parisienses…

2 – Seu coração bate diferente… franceses são assim, estão sempre falando e vivendo apaixonadamente. Estaria ela encantada por algum gato? Por mim???? Pois afinal, o que a tiraria da França e a traria até aqui?!

3 – Sempre magrinha, a busca por uma estética francesa da magreza, bulimia, anorexia…. doenças que avançam nos tempos atuais.

4 – Lombriguinha gigante? FO-ME! COMPULSÃO!

Soluções:

Cara Janes,

1 – Sei que a França deve ter um apelo culinário bem forte e que você está sempre em busca de novidades. O que sugiro é que você varie formas de ração caso ache necessário. Eu, a vida inteira, comi da mesma ração. Ah, mas nenhuma ração é suficiente… então temos que partir pra 2.

2 – Não consigo ouvir seu coração daqui, teria que me aproximar mais para ouvir e acho melhor não. Há que ver que tipo de exercício seu cardiologista permite que você faça. Se ele permite exercícios, é isso que você terá que fazer, brinquedos que estimulem a pular, a correr, que mamãe jogue muitas bolinhas longe, que amarre barbantes no alto da casa para você pular e pegar. Se você não pode se exercitar nada, vamos ao 3.

3 – Há alimentações felinas que são muito saudáveis atualmente, são mais caras, mas nada que uma francesa não possa adquirir. Essas alimentações são naturais, logo, não possuem sódio e isso ajudaria muito seu coração. Veja com seu veterinário que tipo de carne você pode comer e onde sua mamãe adquiria para que tenha certeza que é uma carne limpa, fresquinha e segura pra você.

4 – Minha irmã Christie sofre de uma compulsão por comer tudo que vê pela frente: fios, cabelos, bichos! Cuidado, é importante que sua mãe sempre esteja ao seu lado para afastá-la da compulsão e guiá-la pelo caminho correto. Peça para que ela não permita de forma alguma que você pegue sabonete e coisas do tipo para comer, que chame sua atenção quando isso ocorrer e a ajude a ficar na realidade.

Espero ter resolvido seu caso e… se me permite uma opinião, para os padrões brasileiros até que você está uma fofinha bem gatinha!

Próximo caso.

Dr. Borges, o gato.